A ONG evangélica Missão Caiuá, sediada em Dourados, tem R$ 213 milhões para receber até o fim deste ano em contratos com o Ministério da Saúde para cuidar da saúde indígena. Moradores de aldeia localizada no município-sede da entidade apontaram ao Correio do Estado a falta de medicamentos nas aldeias do interior de Mato Grosso do Sul.
“Nossa saúde aqui está precária. No posto de saúde não tem nada de medicamento. Estamos sem viatura e sem telefone para ligar no polo-base de Dourados”, disse Reinaldo Arevalo, conhecido como Dinho, capitão da Aldeia Bororó.
De acordo com o líder da comunidade indígena, além da ausência de remédios e assistência básica, os indígenas locais convivem diariamente com a falta de água potável, o que, segundo ele, afeta a qualidade de vida e, consequentemente, causa diarreia e outras enfermidades, principalmente em crianças.
“Não está fácil, e eu sei que tem dinheiro. A questão principal é não saber administrar essa verba, que interessa não somente a Aldeia Bororó, mas a Aldeia Jaguapiru”, frisou Dinho.
Sem se identificar, um dos líderes da Aldeia Jaguapiru, também de Dourados, destacou a precariedade do acesso à àgua na aldeia.
“Trabalho na parte de saneamento, e em um dia a gente tem água, no outro não tem”, pontuou.
Questionado sobre a presença da ONG Missão Caiuá nas atividades da região, o líder se mostrou surpreso com o valor de R$ 213 milhões que a entidade deve receber até o fim do ano e com os R$ 872 milhões que já recebeu durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
“Trabalho para a ONG Missão Caiuá, sou contratado por eles, mas não chegou na aldeia [o valor recebido pela entidade]. Fora que saúde e medicamento, essas coisas, não têm.
Nos reunimos com os gestores de lá, e eles reclamaram bastante que a Missão Caiuá está sem verba para pagar funcionários, almoço, medicamentos. Fico espantado de saber que vem tudo isso aí [dinheiro] e os gestores estão reclamando da falta de verba”, finalizou.
Sediada em Dourados, a ONG evangélica Missão Caiuá (organização que já recebeu cerca de R$ 872 milhões em contratos para cuidar da saúde indígena entre 2019 e 2022) deve receber outros R$ 213 milhões até o fim deste ano em contratos que ainda estão em vigor.
Os repasses foram identificados por meio do portal da Transparência do governo federal e apontaram que a organização tem 10 contratos em vigência junto ao Ministério da Saúde com o objetivo de cuidar da saúde dos povos indígenas de várias regiões do País.
De acordo com a transparência federal, o contrato mais antigo ainda em curso foi firmado em dezembro de 2013.
Com valor total de R$ 203.509.681,99, a ONG já recebeu R$ 174.277.696,25 e, conforme o vínculo indicado pela transparência governamental, o contrato entre as partes expira em outubro deste ano, ao passo que os demais, assinados em 2019, têm prazo de vencimento em dezembro de 2023.
A reportagem do Correio do Estado entrou em contato com o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI-MS), a fim de saber qual o panorama sobre as verbas utilizadas na saúde indígena de Mato Grosso do Sul, entretanto, não obteve retorno até o fechamento da edição.
Já a ONG Missão Caiuá informou, por meio de nota, que atua apenas de forma complementar na saúde indígena, com a única obrigação de contratar profissionais de saúde que ficam à disposição do DSEI-MS.
“Atualmente temos mais de 700 profissionais contratados só aqui em MS, e estes ficam à disposição do governo federal e compõem as equipes de saúde indígena”, disse a entidade.
A ONG acrescentou que o convênio não é responsável por outras despesas, como alimentos, remédios, transportes, entre outros.
“Paralelo a isso, a entidade tem um hospital (Hospital Porta da Esperança) ao lado das aldeias em Dourados e atende de forma gratuita a todos os indígenas (atendimento básico e primário)”.
A Missão Caiuá também reforçou que vive de doações, e os recursos recebidos para o hospital e pelos convênios não podem ser direcionados para a compra de alimentos.
Saiba: Entre os contratos para contratação de profissionais para atuar na saúde indígena que a ONG têm com o governo federal, alguns deles são para atuação na DSEI Yanomami, em Roraima, onde foram identificados casos de desnutrição e óbitos infantis. Por causa disso, o Ministério da Saúde decretou emergência de saúde no local.