31/05/2023 às 14h32min - Atualizada em 31/05/2023 às 14h32min

Em meio à tensão, indígenas dizem que não deixarão terras

Manifestações contra a aprovação do PL 490 foram mobilizadas por lideranças indígenas do Estado na Praça Ary Coelho e na Assembleia Legislativa

Contrários à aprovação com urgência do Projeto de Lei (PL) nº 490/2007, que define um marco temporal para demarcação de terras, indígenas estão relutantes em deixar território retomado.

Durante a mobilização feita por indígenas das etnias terena e kinikinau na Praça Ary Coelho na tarde de ontem, após protesto na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, foi relatado ao Correio do Estado o clima de preocupação dentro dos territórios revindicados pelos indígenas do Estado.

O indígena da etnia terena Devanilson, de 24 anos, que mora na retomada da Fazenda Esperança, em Aquidauana, falou sobre o momento de tensão que vivem os indígenas em razão da aprovação do PL do Marco Temporal.

“Nós não estamos tranquilos com este pedido de urgência dos parlamentares, ficamos preocupados com o que pode acontecer, mas temos de manter a calma. Nesta quarta-feira completa 10 anos que estamos na retomada”, disse Devanilson.


Questionado sobre a possibilidade de os indígenas terena serem forçados a deixar a retomada, caso o marco temporal seja aprovado em todas as instâncias, Devanilson ressaltou que haverá resistência.

“Medo de sair não temos, porque o pessoal não vai sair de lá, vai existir um conflito. Se o PL for aprovado, o meio ambiente também vai sofrer, a nossa indignação é esta tentativa de retrocesso que está tendo neste governo, mas vamos lutar até onde der”, declarou.

A possível aprovação do marco temporal para demarcações de terras indígenas pode afetar o processo de 16 áreas reivindicadas em Mato Grosso do Sul. 

De acordo com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), esse número representa a quantidade de áreas que estão em estudo no Estado, as quais podem ser diretamente impactadas caso a medida seja aprovada. 

Para a representante do Conselho Municipal de Direito e Defesa dos Povos Indígenas (CMDDI) de Campo Grande, Silvana Albuquerque, os povos guarani-kaiowá serão os mais afetados caso o PL seja aprovado em sua totalidade.

“Acredito que as terras dos guarani-kaiowá podem ser as mais afetadas caso o PL seja aprovado. Acredito que é um retrocesso muito grande. Precisamos do território, e eles [ruralistas] precisam do meio ambiente para uso próprio. Não tomamos nada, pelo contrário, somos a segunda maior população de MS e estamos há 523 anos brigando e lutando por nossas terras, direito nosso”, disse Silvana.

Com relação à aprovação do PL do Marco Temporal pela Câmara dos Deputados, a coordenadora-executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Val Eloy Terena, informou que entidade tem planos de manifestações para que os políticos recorram da decisão.

“Se for aprovada na Câmara dos Deputados, com certeza a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil vai descer toda para Brasília e vai fazer a luta que a gente sempre fez”, declarou Val Terena.
Quanto ao apoio político dos deputados, que é necessário para impedir a aprovação da lei, o movimento indígena acredita que deve haver cobrança para que os parlamentares defendam os direitos dos povos indígenas.

“Tivemos candidatos eleitos com voto indígena, agora é o momento de a gente cobrar que eles defendam os nossos direitos. Sem a demarcação, não temos como falar de educação e saúde, a gente precisa ter o território demarcado para trazer política pública”, afirmou a coordenadora-executiva.

PROJETO DE LEI

Ontem, o Projeto de Lei nº 490/2007 foi aprovado na Câmara dos Deputados com 283 votos favoráveis contra 155 desfavoráveis. O projeto ainda seguirá para votação no Senado.

No dia 25, os deputados federais aprovaram um requerimento para dar urgência na tramitação do PL nº 490/2007, que define o marco temporal. Foram 324 votos favoráveis, 131 contrários e apenas 1 abstenção.

O marco temporal é uma tese jurídica que determina que os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as áreas que ocupavam ou já disputavam até o dia 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. 
A tese surgiu em 2009, em parecer da Advocacia-Geral da União sobre a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, quando tal critério foi utilizado.

De acordo com a Câmara dos Deputados, está marcado para o dia 7 de junho o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o marco temporal. 

Os ministros vão decidir se a promulgação da Constituição deve ser adotada como parâmetro para definir a ocupação tradicional de terras por indígenas. 

SAIBA

Diversos representantes de povos indígenas protestaram no Salão Verde da Câmara dos Deputados, em Brasília, nesta terça-feira, contra a votação marcada para hoje do marco temporal de terras indígenas. 


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