08/04/2020 às 10h16min - Atualizada em 08/04/2020 às 10h16min

Linha de frente: a tormenta de quem pegou covid e a tensão dos profissionais -

“A parte mais difícil é com o meu filho de três anos. Ele fala: mamãe, me dá um beijo?”, diz enfermeira com coronavírus -

Por Aline dos Santos - CREDITO: CAMPO GRANDE NEWS
Enfermeira, Keity contraiu o novo coronavírus durante o trabalho em hospital de Nova Andradina. (Foto: Arquivo Pessoal) -
Ao término da entrevista de 20 minutos, a enfermeira Keity Marielle Alberto Rodrigues, 30 anos, me felicita por esse 7 de abril, Dia do Jornalista, mas é a profissionais como ela que cabe todo o agradecimento. 

Keity contraiu o novo coronavírus (covid-19) durante o trabalho em hospital de Nova Andradina, precisou ser internada em Dourados por conta do desconforto respiratório, enfrentou noites atormentada pelo medo de dormir e até hoje ainda sofre ao ser ver obrigada a negar abraço ao filho de três anos.

A previsão é que a quarentena acabe na próxima sexta-feira, porém o estresse dos dias vividos ainda é tratado com apoio de psiquiatra e psicólogo.

A enfermeira é um dos profissionais que atendeu a paciente de 64 anos que foi a primeira a morrer pela doença em Mato Grosso do Sul. A idosa era moradora de Batayporã, mas foi atendida em hospital particular  de Nova Andradina.

A enfermeira relata que o hospital ofereceu todo equipamento de proteção necessário e que não teve muito contato com a paciente, contudo, logo começou a ter sintomas da doença.

“Comecei com tosse, passei a ter febre. Estava trabalhando e uma médica me consultou. Fui dispensada e fui para o isolamento domiciliar. Aí veio a perda de apetite, você não sente gosto, não sente cheiro, não sente nada. Você quer comer, mas não consegue”, relata.

Confinada num quarto com banheiro, ela mantinha distância da família, mas precisou sair para ir ao hospital onde trabalha em busca de atendimento. A covid-19 estava provocando desconforto na respiração. “Fui a Dourados para o infectologista me examinar e fui internada porque estava nos dias críticos da doença. Usei cateter com oxigênio, mas não fui entubada”, relata.

Nos dias que passou de enfermeira à paciente, Keity conta que não conseguia dormir no hospital. “Tinha medo, ficava com pânico”. Depois de três dias de internação, ela hoje está em casa e passa pela reta final do período de isolamento. 

 “Consigo dormir e o apoio do psiquiatra está me ajudando muito”, diz. Com tantos sintomas, ela abre o coração ao dizer sobre o que é mais difícil em toda essa jornada da covid-19.

“A parte mais difícil é com o meu filho de três anos. Ele fala: mamãe, me dá um beijo? Me dá um abraço? E eu não posso tocar nele”, diz a enfermeira.


Pronto para o trabalho: Mesmo acostumado a tensão do pronto-socorro, Ruan conta que perdeu peso e ganhou marca no rosto por tanto usar máscara. (Foto: Arquivo Pessoal)

Na face humana de quem atua na linha de frente contra o coronavírus, também está o enfermeiro Ruan Diego Dias, 27 anos, que trabalha em dois hospitais particulares de Campo Grande. 
Desde a chegada da doença, mesmo com a experiência de quem encara 36 horas de plantão no Pronto-Socorro, ele conta que já perdeu três quilos, ganhou olheiras e a marca da máscara de proteção no rosto.

No setor destinado a quem procura a unidade hospitalar com síndrome respiratória, ele usa o material de proteção como se todo paciente tivesse a covid-19.

Com itens que incluem  máscara, óculos, touca, capote (avental) e luvas, o profissional conta que acaba deixando as necessidade biológicas, como ir ao banheiro ou comer, para depois. A cada vez que precisa sair do local de atendimento, é necessário descartar quase todo o material de proteção individual para evitar contaminação.

Novo, o coronavírus espanta pela rapidez em que se altera o quadro do paciente. Aí, é preciso controlar a própria ansiedade e incertezas para apoiar o doente, que já está longe da família.

 “A gente não sabe o que vem pela frente, o cenário muda. Mas temos que acalmar o paciente. É complicado, nunca tinha visto doença que evolua tão rápido”, narra o enfermeiro, sobre a nova rotina em tempos de coronavirus.

No campo particular, Ruan já não pode ver a namorada, abraçar a sobrinha ou ter contato com parente idoso.

“Por mais que a gente tenha instrução por ser profissional da Saúde, somo seres humanos e essa restrição de contato é muito difícil. Mas é a vida que a gente escolheu, se for necessário, abro mão de ficar em casa para ajudar quem tem necessidade”, conta o enfermeiro.

Materiais de proteção – O SinMed-MS (Sindicato dos Médicos de Mato Grosso do Sul) percorre as unidades de saúde de Campo Grande e aponta que ainda há materiais de proteção para os profissionais. 

“Ainda temos materiais nos hospitais, postos. A gente sabe que é início de pandemia e se preocupa, principalmente agora com a abertura do comércio, porque a tendência é aumentar os casos e os materiais no mundo todo são escassos”, afirma o presidente do sindicato, Marcelo Santana Silveira.  São 8.500 médicos ativos no Estado.

O SinMed e a Associação Médica doaram 310 litros de álcool em gel e 350 unidades de álcool líquido para a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) de Campo Grande.

“Não tem nenhum profissional se queixando de falta de material, a preocupação é se acabar e não ter disponível no mercado. Fizemos uma parceria com o Tribunal Regional do Trabalho e está sendo disponibilizado recurso para comprar matéria prima e confeccionar os materiais. São 300 capotes (aventais), 150 óculos, 150 protetores faciais e 400 máscaras N 95”, afirma o presidente do Siems (Sindicato dos Trabalhadores na Área de Enfermagem de Mato Grosso do Sul), Lázaro Santana. O Estado tem 22 mil técnicos, auxiliares e enfermeiros.

Plataforma - Os médicos que atuam em unidades de que oferecem assistência a casos confirmados e suspeitos de coronavírus  poderão informar falhas na infraestrutura de trabalho oferecida por gestores (públicos e privados) pela plataforma https://sistemas.cfm.org.br/fiscalizacaocovid/

Conforme o presidente do CRM-MS (Conselho Regional de Medicina), Alex Fabiano Nametala Finamore, foi estabelecido  um conjunto de orientações, pois é preciso atender a população sem colocar em risco a vida do médico e toda equipe multidisciplinar. -
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